quarta-feira, 14 de julho de 2010

6 - A importância da leitura

O ENSINO E A APRENDIZAGEM DA LEITURA

Salientemos, em primeiro lugar, que os fundamentos aqui expostos não esgotam o tema da leitura e de seu ensino. Buscaremos, com o que segue mostrar como diferentes correntes teóricas puderam informar certo modo de ver a leitura, modo esse que está condicionado a recortes epistemológicos e que, portanto, não resulta de uma aplicação direta de uma teoria particular a uma situação de ensino particular. Talvez devamos falar em diretrizes que possam orientar a didática da leitura, no sentido de superar os problemas e a situação de crise configurada no começo de nossa exposição.

Um outro aspecto a salientar é que, quando falamos em leitura extra classe, não queremos estabelecer oposição com a leitura que se faz na escola e na sala de aula. Ao contrário, nossa visão é processual, ou seja, lê-se na escola, aprende-se a ler na escola para se ler fora dela, e continuamente; lê-se na escola e aprende-se a ler na escola porque, efetivamente, lê-se fora dela. Isso nos coloca, inicialmente, o desafio de fazer a leitura extrapolar sua finalidade estritamente pedagógica. A escola é um espaço de leitura, entre os muitos que há: a família, a igreja, o trabalho, o grupo de amigos, o quarto de dormir etc.

Passemos agora aos fundamentos. Consideremos a escola o lugar de se aprender a ler e a gostar de ler. Nesse lugar, desempenha papel fundamental o professor. Ele, como "texto", foi o parceiro, o mediador, o articulador de muitas e diferentes leituras, de muitos e diferentes textos. É o que sugere Silva (1985). Depois de afirmar que o professor é o melhor "trabalho" a ser lido pelos alunos, o autor mostra que, agindo assim, o professor é o responsável pela interdisciplinaridade, na medida em que faz incursões pelos diferentes campos do conhecimento.

Para ler muito, ler tudo, alunos e professor devem dessacralizar o trabalho e a biblioteca, que deixam de ser objeto de adoração e templo sagrado, intocáveis. Ler tudo implica, inclusive, trazer para dentro da escola os textos esquecidos, considerados "subliteratura": o gibi, o catálogo telefônico, o best-selller, a propaganda, o panfleto que se distribui na rua, a receita de culinária, ao lado dos clássicos, da literatura informativa. Ler tudo implica desvendar, elucidar a retórica de cada texto, a gramática subjacente a cada um. Desprovidos de preconceito, livres das amarras das rotinas burocratizadas da escola, faremos da leitura um ato criador / questionador.

É o que sugerem Bordini e Aguiar (1993). As autoras propõem uma seqüência para a didática da leitura (e seqüência aqui não quer dizer imobilidade), a qual pode ser bastante produtiva: diagnóstico de necessidades e expectativas do aluno; atendimento das necessidades e expectativas; ruptura e quebra das expectativas; questionamento; alargamento da vivência cultural e da visão de mundo. Com base nessa seqüência, seria possível, por exemplo, ler um texto-clichê, questioná-lo e confrontá-lo com o texto literário, singular por definição. Teríamos aí o atendimento dos interesses e necessidades do aluno, mas também, e, sobretudo, a possibilidade de criar novas necessidades culturais e estéticas, aprendidas na escola.

Torna-se imprescindível, como se vê criar no ambiente pedagógico um clima favorável à leitura, marcado por interações abertas e democráticas. Interações que vão permitir muitas leituras de um mesmo texto, por sujeitos que têm histórias, competências, interesses, valores e crenças diferentes. Ao professor cabe reconstruir com seus alunos a trajetória interpretativa de cada um, buscando compreender a construção de cada sentido apontado.

A diversidade ainda deve ser o eixo dos propósitos da leitura, determinando diferentes tipos de relação com o texto. Bordini e Aguiar, citadas acima, apresentam, na mesma obra, vários métodos para o encaminhamento pedagógico da leitura: o científico, o criativo, o comunicacional, o semasiológico e o recepcional, que estariam ligados, respectivamente, à busca de informação, à recriação do texto, à identificação dos elementos do processo comunicativo, às diferentes linguagens e sistemas semióticos e, finalmente, ao impacto da obra sobre o leitor. Como deve ter ficado claro, são diversas as possibilidades de exploração, encaminhamento e avaliação da leitura na sala de aula.

A proposta de Bordini e Aguiar guarda certa semelhança com a tipologia de leitura sugerida por Geraldi (1997). Esse autor diz que, conforme a relação que estabelecemos com o texto, terá: leitura-busca-de-informações; leitura-atividade; leitura-fruição e leitura-pretexto. Discutindo a leitura-pretexto, Geraldi (1997) afirma não ver problema no fato de um texto ser utilizado como pretexto para certa prática escolar. A questão estaria, segundo ele, em como a escola constitui a nossa relação com os modelos: trata-se de optar entre uma relação de submissão, para pura imitação, e uma relação crítica e criativa, para se ampliar o sistema de referências culturais e simbólicas. Temos aqui delineada a necessidade de atribuir sentido a toda e qualquer prática de leitura. Como foi destacado por Kleiman (1997), as interações conferem sentido ao ato de ler e toda atividade pedagógica relativa a ele deve ser exeqüível, relevante e dotada de sentido, numa cadeia ininterrupta.

Com relação à aprendizagem do sistema lingüístico, a leitura se constitui numa prática das mais valorosas. Isso porque permite o acesso a formas caracteristicamente explícitas de interação verbal, como salientado por Rego (s.d.), em estudo sobre aspectos sócio-funcionais da escrita e da alfabetização. Desse modo, se as interações cotidianas, em contextos privados e imediatos, ocorrem de forma relativamente bem-sucedida, o mesmo não se pode dizer do trato com a língua formal em contextos mais abstratos de interação a distância. A leitura é, portanto, caminho e oportunidade de lidar com a escrita e seu alto grau de abstração e autonomia contextual.

Em se tratando de recursos expressivos, a inserção no mundo da escrita amplia nosso repertório lingüístico, funcionando, indubitavelmente, como um entre os vários caminhos da aprendizagem da língua. E aqui devemos falar do papel do professor e da escola outra vez: ninguém aprende a lidar com a língua e o uso da língua de modo automático e espontâneo. É preciso que alguém ensine o aluno a desenvolver sua sensibilidade e a lançar novos olhares sobre os sistemas simbólicos. O olhar apurado, aprendido, faz um novo sujeito, que questiona, indaga, descobre, inventa, compara, coteja, transforma, aprende, ensina. Por isso a análise comparativa de textos se faz tão fecunda.

Por exemplo, já tivemos oportunidade de realizar, em sala de aula, uma atividade de leitura do célebre poema de Manuel Bandeira sobre os meninos carvoeiros. O caráter de texto literário permitiu um trabalho com diversos conceitos como os de gênero literário, recursos expressivos, níveis de linguagem, imagens e metáforas, símbolos e sugestões, universalidade do texto literário, especificidades da obra poética, o lúdico, a rima, o ritmo, o som, a magia, a fantasia. De outra parte, por reconhecer que também é preciso trabalhar com leituras informativas, cuja interpretação é condicionada por um determinado contexto sócio-histórico, leituras mais ligadas às demais áreas de conhecimento e à pesquisa, propusemos, ainda como parte da atividade, a leitura do texto jornalístico Os homens da fumaça, sobre carvoeiros, adultos e crianças quase-escravos do Centro-Oeste do Brasil. Essa foi uma matéria publicada na Revista Veja e o confronto dos textos nos permitiu, no processo de ensino, um diálogo do presente com o passado, num diálogo de visões de mundo, um diálogo de modos de operar com a linguagem.

Por isso, certamente, os estudiosos da leitura remetem tão freqüentemente ao conceito de intertexto, que é o que, de fato, a escola deve fazer e permitir que se faça dentro e fora dela. Se, nesse aspecto, ela for bem-sucedida, terá cumprido sua função. Abaurre (1985) defendem enfaticamente a importância da leitura para a aprendizagem em geral. Os autores chegam a afirmar que a capacidade de ler é a grande herança que a escola pode deixar para o aluno. Com base neles, encerramos nossa exposição, dizendo que a leitura - tal como aqui concebida -, se for bem aprendida e prosseguir fora da escola, constitui-se num caminho para a realização de mais interações, construção de mais sentidos, superação do imediato e concretização de uma vida mais feliz para todos.

Fonte: http://www.webartigos.com/articles/3046/1/A-Importancia-Da-Leitura-Nas-Series-Iniciais/pagina1.html#ixzz0thNgZ7Va

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