Hoje,
a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) começa a receber
as inscrições dos candidatos ao Vestibular 2013. É mais um passo na vida
de milhares de jovens que desejam ingressar na maior universidade do
Estado. Para alguns, a preparação para disputar uma das 3.015 vagas
oferecidas começou há mais de um ano. A rotina é uma maratona de
estudos, leituras e aulas. No entanto, essa não é a realidade para boa
parte dos alunos da rede estadual de ensino. A três meses das provas,
muitos não tiveram sequer uma única aula de disciplinas como Química,
Física ou Inglês.
A
falta de professores com formação específica, aponta a secretaria de
Estado da Educação e da Cultura (SEEC), é a principal causa do problema.
Na tentativa de contornar a situação e proporcionar mais preparação
para os vestibulandos, algumas Diretorias Regionais de Educação Cultura e
Esportes (Direds) estão disponibilizando "aulões" nos fins de semana.
Para preencher o quadro de pessoal, o Governo do Estado anuncia, nesta
semana, uma nova convocação de professores aprovados no último concurso
público. Dessa vez, a lista terá 900 nomes.
Na última chamada, a
SEEC convocou 1.013 professores. Deste total, 875 foram efetivados. "Os
demais não compareceram ou pediram reclassificação no concurso",
explicou Joaquim Oliveira, secretário adjunto da SEEC. "Nessa chamada,
vamos priorizar justamente as disciplinas mais carentes: Química,
Física e Biologia", completou.
Alunos da Escola Estadual
Sebastião Fernandes de Oliveira vivem um verdadeiro drama. No início do
ano, eram duas turmas de pré-vestibular. Com o quadro reduzido de
professores, a direção se viu obrigada a unir as duas turmas.
Atualmente, mais de 40 alunos dividem o mesmo espaço. Na tarde da última
terça-feira, um professor de Matemática dava aula de geometria
analítica. A presença da equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE
instiga os alunos. "Não tem aula de Física", grita um. "Também não tem
Inglês nem Educação Física", avisa outro.
Com os ânimos
exaltados, a classe recebe a equipe e conta as dificuldades. "É um
absurdo o que estão fazendo com a gente. Não tivemos nenhuma aula de
Física, Espanhol e Inglês. Como faremos Enem e vestibular?", questiona
Luciane Sampaio, 18 anos. "Sem contar que, por conta da falta de
professores, tem dias que temos três horários seguidos da mesma matéria.
É muito cansativo e improdutivo", completa a aluna que pretende
prestar vestibular para Psicologia.
Sem a oferta de aulas na
escola, alguns se matriculam em cursinhos preparatórios para o
Vestibular. É o caso de Calen Pacheco, 19 anos. Para concorrer a uma
vaga no curso de Serviço Social, Calen paga R$ 110,00 num cursinho da
cidade. "Se não fosse isso, acho que nem faria as provas. É o único
jeito de aprender algumas coisa", diz. No Churchill, inglês só nos livros.
Os
alunos do terceiro ano do segundo grau da Escola Estadual Winston
Churchill , um das mais tradicionais escolas da rede estadual de ensino,
aguardam por outro professor. Até agora, eles não tiveram aula de
inglês. A diretora da escola, Maria Eliane, informa que o problema não
atinge apenas os alunos de pré-vestibular. "O único professor que
atendias às turmas do ensino médio pediu licença médica no mês de março
e, até agora, não recebemos o professor substituto. Já comuniquei o fato
à SEEC e estou, assim como os alunos, aguardando uma solução", disse.
Rafael
Medeiros, 17 anos, e Matheus Gomes, 16, são alunos da escola. Ambos
pretendem fazer vestibular no final do ano. Porém, aquele acha que irá
desistir de concorrer por não se sentir preparado. "Ano passado,
estudava no interior e lá tive poucas aulas de Química e Física. Vim
para Natal, em busca de um estudo melhor, e estou sem aula de Inglês.
Desse jeito, melhor nem fazer a prova", diz Rafael. Matheus está mais
confiante e, além do Vestibular UFRN, fará a prova do Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem). "Sei que não vou concorrer em pé de igualdade com
os alunos da rede privada, mas estou estudando em casa e vamos ver o que
acontece", coloca.
Para
ajudar os alunos, algumas Direds ofertam as aulas deficitárias aos fins
de semana. De acordo com Joaquim Oliveira, a 12ª Dired, em Mossoró, é
pioneira no programa. "Estamos montando aulões nas Direds, onde a SEEC
disponibiliza transporte, leva professor de outro município, de outra
escola, pagando hora suplementar. O quadro de hora suplementar está alto
para cobrir essa deficiência", diz. Porém, o secretário adjunto deixa
claro: os aulões não resolvem o problema. "Apesar dos esforços, mesmo
assim, é insuficiente para a demanda que temos".
Governo vai convocar 900 novos professores
Para
suprir a necessidade das escolas que estão sem professores, a titular
da SEEC, Betania Ramalho, anuncio uma série de medidas. A principal
delas, é a convocação de aproximadamente 900 professores. A nomeação
deve ser publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) até a próxima
quarta-feira. Além disso, de acordo com publicação no DOE da última
sexta-feira, houve a prorrogação dos contratos dos professores
temporários que estão em exercício.
Em nota divulgada à imprensa,
a SEEC informa ainda que está dobrando o número de professores com
horas suplementares, onde os servidores que já trabalham em regime de 30
horas semanais, passam a trabalhar 40. "No total, 2.197 professores do
estado estão recebendo hora suplementar em 2012", diz o informe. O
Governo do Estado diz também que o remanejamento dos professores que
estão fora de sala de aula continua. "Há escolas em que o número de
servidores em atividades de apoio pedagógico é superior ao de
professores em sala de aula e o nosso foco é a sala de aula", explica
Betania.
Para auxiliar o setor pessoal, a SEEC disponibilizou o
Sistema de Gestão de Pessoal (SAGEP). A ferramenta, segundo a
secretaria, foi criada para corrigir distorções e identificar onde está
lotado cada servidor, qual sua função, carga horária, solicitações de
licença, readaptações, férias e aposentadorias. "O SAGEP revelou que há
um elevado número de professores que deveriam estar em sala de aula, mas
estão em desvio de função. Enquanto isso falta professor para as
disciplinas que deveriam ser ofertadas aos alunos. O novo sistema veio
para corrigir essas distorções e qualificar a prestação do serviço à
população escolar", afirmou a secretária.
Escola aprova 80% dos alunos no Vestibular
A
realidade das escolas públicas estaduais não é atrativa para os alunos e
professores. O secretário adjunto da SEEC, Joaquim Oliveira, é taxativo
ao afirmar que o modelo de ensino atual está falido. Um reflexo dessa
situação é a baixa aprovação dos alunos oriundos da rede pública no
Vestibular da UFRN.
Mas há exceções. É o caso do Centro Estadual
de Educação Profissional Senador Jessé Pinto Freire (Cenep). De acordo
com a direção da escola, no último vestibular, 80% dos alunos foram
aprovados.
É fácil entender o sucesso dos alunos. O Cenep
difere-se das demais escolas primeiramente na aparência. A estrutura é
bem conservada. Corredores e chão estão sempre limpos. Nas salas de
aula, há condicionadores de ar e os quadros são brancos. Cadeiras
inteiras e alunos, na maioria fardados. O discurso destes também é
diferente. Não há reclamações tão comuns em outras escolas. Pelo
contrário, ao Cenep, só elogios.
"Podemos dizer que essa escola é
top. Não temos do que reclamar. Temos todas as aulas, os horários estão
completos e contamos ainda com aulas de reforço", diz Deyvika Lima, 19
anos, que irá prestar vestibular para o curso de Serviço Social.
REFORÇO
A
professora de Português, Claudia Teresa, explica que os alunos do
pré-vestibular recebem reforço de Literatura. "Atualmente, estamos
trabalhando as obras literárias que serão cobradas no Vestibular deste
ano", diz.
No Vestibular UFRN 2013, cerca de 50 alunos do Cenep
irão disputar uma das vagas oferecidas. Ano passado, dos 55 alunos
inscritos, 44 foram aprovados. "E a expectativa é de repetir o sucesso
novamente", colocou.
Bate-papo
Joaquim Oliveira » secretário adjunto da SEEC
Como está o trabalho do censo na secretaria?
Tínhamos
a estimativa de 1.700 funcionários que não sabíamos onde estavam. Os
que se apresentaram, estavam em alguma função, está normalizado.
Apareceram vários casos que cada um responde a um processo para se
explicar. Temos cerca de 400 processo de sindicância abertos.
Qual o maior deficit da SEEC?
Quando
foi feito levantamento, vimos que o grande déficit são nas matérias de
Química, Física e Biologia. Não temos muito pessoal formado. No
concurso, em alguns municípios ninguém apareceu porque realmente falta
pessoal com formação. Não têm interesse também. Isso é um problema do
país inteiro. O que estamos estudando é como complementar a carga
horária com outros processos que não seja a forma presencial daquele
professor. Ensino à distância, telecurso, tem que criar algo. Não é
concurso que vai resolver. É uma carência de mercado.
E qual região do Estado mais preocupante?
A região mais preocupante é a "Tromba do Elefante" e o Mato Grande, devido à carência de mão-de-obra.
A greve do ano passado ainda reflete neste ano?
O
reflexo da greve acontece na perda de aprendizagem que o aluno não
traz. O reflexo é no aluno e não no calendário da escola. Toda
paralisação é fatal para o processo de ensino e aprendizagem.
Por quê não interesse dos profissionais em seguir carreira como professor?
Há
uma conceituação social de baixa valoração do professor. A própria
sociedade pode reforçar o papel do professor porque isso repercute
depois. Mas temos professores que conseguem fazer a diferença. Nós temos
um dilema a resolver: trabalhamos com um modelo de escola do século
XIX, com professores formados no século XX e alunos do século XXI. É um
nó que a sociedade não desatou ainda. O modelo de escola está falido. A
escola não atrai mais diante do avanço das tecnologias e mídias. A
escola não atrai mais. Então, que proposta colocar para esse nova
geração e que professor preparar para esse nova geração?
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